Suzana Camargo

Gente transformando gente

Suzana Camargo – 14/08/2013

Sempre nos questionamos se nossos atos isolados e solitários estão realmente mudando ou fazendo alguma diferença na vida do próximo. A doação de uma peça de roupa, o trabalho voluntário na escola do filho, o tirar o papel da rua no bairro onde vivemos.

Para algumas pessoas, não há dúvida sobre a importância dessas ações. Nós somos os únicos responsáveis por fazer a diferença no mundo. Mas elas vão além. Elas mudam suas vidas para transformar a realidade dos outros. São os chamados empreendedores sociais.

A cineasta brasileira Mara Mourão passou 40 dias viajando pelo mundo para descobrir e levar para as telas histórias de empreendedorismo social. Acompanhou o dia a dia dessas pessoas em sete países: Alemanha, Suíça, Peru, Estados Unidos, Canadá, Tanzânia e Brasil. Premiado em vários festivais internacionais, o documentário Quem se Importa* (leia a resenha do filme, publicada aqui no site) pretende ser mais que um filme e se tornar um movimento em prol do empreendedorismo social. “Somos nós os responsáveis pela mudança”, afirma a cineasta.

Mara Mourão foi uma das palestrantes do 106º Fórum do Comitê da Cultura de Paz, promovido pela Associação Palas Athena, em parceria com a Unesco, realizado esta semana no auditório do MASP em São Paulo. O encontro teve como tema Inquietações – Inovações Sociais: O coletivo em busca de uma nova cara. Além da cineasta, partilharam suas histórias André Gravatá, jornalista, pesquisador da área de educação e um dos criadores do Coletivo Educ-ação e Djalma Santos, educador social, músico e vice-presidente da Rede Cultural Beija-Flor.

Quem se Importa estreou no Brasil no ano passado. Depois disso, já rodou o mundo. Chegou a ser apresentado na Conferência de Empreendedorismo da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. No auditório do MASP, Mara Mourão mostrou o trailer do documentário e falou sobre a experiência de conhecer e relatar histórias bem sucedidas de pessoas que decidiram mudar a vida de comunidades. Entre os entrevistados estão Muhammad Yunus, premiado como Nobel da Paz pela luta contra a pobreza em Bangladesh, e Bill Drayton, fundador da Ashoka, uma das maiores organizações mundiais ligadas ao empreendedorismo social.

Parcerias são fundamentais para mudar o coletivo. “É necessário um casamento do setor privado, público e da comunidade”, disse Mara. “As empresas precisam ter a responsabilidade social na sua essência”. Ela comentou ainda das oportunidades de transformação geradas pela economia criativa, em que as populações podem ser estimuladas a prosperar com recursos e conhecimentos próprios.

Há dez anos trabalhando na Rede Cultural Beija-Flor, uma organização que atua dentro da comunidade carente de Eldorado, no município de Diadema, na grande São Paulo, Djalma Santos, contou como se envolveu no trabalho do terceiro setor. Foi o samba de que gostava tanto, que o acabou levando a procurar a entidade e se oferecer para dar aulas de música. O começo não foi fácil, mas Djalma não desistiu. “Sempre senti uma inquietude, uma euforia, uma vontade de fazer alguma coisa”, lembrou. “Me sentia extremamente incomodado com a situação da nossa comunidade”.

A inquietação fez Djalma largar o trabalho que tinha numa fábrica e se dedicar exclusivamente à Beija-Flor. “Percebi o quanto o nosso trabalho era importante. Conseguíamos entrar em lugares que nenhuma outra organização entrava”, afirmou. Hoje, entre os projetos que coordena está o Jovens Guerreiros, com adolescentes entre 11 e 13 anos. Entre as atividades que os jovens participam está a realização de uma pesquisa com vizinhos para descobrir quais são as reais necessidades da comunidade. “Eles vão aprender a ouvir o outro e se colocar no lugar dele. Quando percebemos o outro, voltamos diferente”, disse Djalma. “É um aprendizado coletivo”. Das pesquisas nascerão miniprojetos, feitos pelos próprios adolescentes para melhorar a vida da comunidade.

André Gravatá também viajou bastante para ver de perto diversas realidades. Mas o interesse dele estava em conhecer diferentes modelos educacionais. O jornalista visitou escolas e centros comunitários no Brasil, Argentina e Estados Unidos. Ficou impressionado em perceber como há outras formas de ensinar, bem diferentes da tradicional. “Vemos nas escolas o ensino de um conhecimento fragmentado”, criticou. Diferentemente, em centros de integração da comunidade, criados e administrados por pessoas e educadores da própria comunidade, o conhecimento caminha junto com a valorização da cultura e dos hábitos locais, o que potencializa o aprendizado. “Educação é troca, é plural”, acredita Gravatá.

Para o jornalista, não existem fórmulas prontas para a educação. E o educador também deve aprender constantemente. “A escola é um organismo vivo e é a inquietação que leva à mudança”.

Confira a matéria original no site do Planeta Sustentável