Denise Ribeiro – Palas Athena

A educadora britânica Belinda Hopkins era uma professora de inglês inconformada com a maneira autoritária como os conflitos escolares eram tratados. Considerava ineficaz a tentativa de resolvê-los a partir de perguntas pouco acolhedoras e achava inadmissível não haver espaço para os estudantes se expressarem. “As escolas querem saber o que aconteceu, quem começou, quem é o culpado e que punição devo aplicar”, argumenta. Segundo Belinda, que há 20 anos vem pesquisando formas mais acolhedoras de resolver conflitos, muitas injustiças são cometidas nas escolas, porque os adultos criam regras para as crianças obedecerem, em vez de convidá-las a construir conjuntamente acordos ou combinados, baseados nas necessidades delas.

Construção conjunta, aliás, foi o eixo central do seminário Estratégias Restaurativas – sua Aplicação em Contextos Juvenis – que Belinda realizou na Associação Palas Athena, em São Paulo. Durante dois dias, ela apresentou conceitos inovadores aos 99 participantes – a maioria educadores –, técnicas eficientes para estabelecer e manter relacionamentos saudáveis e formas respeitosas de restaurá-los quando são abalados por algum conflito. “Na escola, no trabalho, no dia a dia com o cliente, na família, os relacionamentos são a coisa mais importante que existe. O ponto de partida é construir pontes que facilitem a conexão entre as pessoas”, explica Belinda.

Os dois dias de seminário foram um treinamento intensivo em mediação de conflitos, com os grupos trabalhando em círculo as propostas da educadora, sendo desafiados a sair da zona de conforto e convidados a praticar técnicas eficientes de acolhimento do outro, como a escuta ativa. Colaboração, respeito, diálogo, silêncio cooperativo, compreensão, confiança, sentimento de pertencimento, responsabilidade, tolerância, inclusão, não-julgamento foram alguns dos valores que ganharam novos significados a partir do trabalho conjunto.

Belinda, que adotou as técnicas da justiça restaurativa para desenvolver sua metodologia, adaptando-as ao universo escolar, subverte a visão de mundo tradicional, ao propor novas abordagens para a resolução de conflitos. Os envolvidos – seja um episódio de bullying ou um desentendimento entre aluno e professor – sempre encontrarão um espaço acolhedor para se manifestar e um ouvidor atento e imparcial para escutar seus pontos de vista. Há cinco questões básicas endereçadas aos envolvidos: O que aconteceu? O que estava pensando quando isso aconteceu? O que estava sentindo? Quem foi afetado e de que forma? Do que vocês precisam para reparar os danos e seguir em frente?

Os nós do conflito começam a ser desatados a partir dessa primeira rodada de escuta atenta. “Ao perceber que sua perspectiva está sendo validada e que alguém está se interessando verdadeiramente por seus pensamentos e sentimentos e procurando compreender seus motivos, o jovem se sente acolhido. Com isso, abre-se o caminho para a reparação do dano cometido”, argumenta a educadora. Com as técnicas restaurativas, a punição é substituída por acordos de reparação propostos e aceitos pelos envolvidos. “Punição não faz os jovens refletirem sobre o que fizeram, faz com que se tornem ressentidos. As técnicas restaurativas, ao contrário, permitem que o jovem perceba o quanto seu ato afetou outras pessoas e se responsabilize por reparar esse dano”.

A eficiência da metodologia restaurativa tem sido relatada por todas as escolas que a adotaram, especialmente no Reino Unido, onde Belinda Hopkins fundou o Transforming Conflict, National Centre for Restorative Approaches in Youth Settings (Transformando Conflitos, Centro Nacional de Estratégias Restaurativas em Contextos Juvenis). Desde o final dos anos 90, ela e sua equipe já treinaram milhares de professores, coordenadores pedagógicos e diretores de escolas nas técnicas de resolução pacífica de conflitos. Em alguns casos, o número de suspensões teve queda de 96%, além de outros benefícios nem sempre mensurados pelas estatísticas. “Um dia, duas adolescentes me pararam na rua pra me contar que tinham se tornado grandes amigas, graças a mim. Eu me lembrei, então, que alguns anos antes havia mediado uma briga séria entre elas. Na ocasião, embora não tivessem nunca mais se agredido fisicamente, passaram a se tratar com frieza. Depois, voltaram a se falar. Achei interessante quererem me contar o quanto minha interferência as tinha ajudado”, conta Belinda. É sua árvore da paz dando frutos, professora.